sábado, 19 de março de 2011

So give me coffee and TV

Aquela xícara de café espresso transbordava. Transbordava a espuma e as angústias da moça molhada pela chuva. Molhada e arrepiada pelo vento do metrô. Sentia frio. Frio por dentro, um frio escuro, frio que dói, que atravessa a alma e para nas vísceras.

Perturbada com o movimento das pessoas ao redor, tomou num gole só o café que lhe desceu quente e grosso pela garganta - queimando a língua e pelando o estômgo. Mas pensou consigo que merecia aquela dor, que merecia o amargo do café pois assim se sentia amarga, e a dor da queimadura apenas trazia à tona sua dor interna.

Esperou a chuva acalmar na esperança de que seus pensamentos em turbilhão acalmassem junto. Ouvia o barulho forte dos pingos batendo no chão, sentia a fúria da água. Sentia sua própria fúria. Os pensamentos tomavam conta, não davam-lhe paz! Queriam sair dela, domar o mundo.

Num rompante, abriu o guarda-chuva já torto pelas rajadas de vento e encarou o temporal novamente. Foi para debaixo daquela cortina de água avassaladora. Sabia que somente isso a libertaria. Seu guarda-chuva foi engolido pelos céus; molhou-se por inteiro num segundo, chovia aos cântaros. A água batia em sua pele dolorosamente, o vento contra si era tamanho que quase não mantinha os olhos abertos. Determinada, andou até a estação e decidiu pegar outro rumo que não o de casa.

Não sabia exatamente para onde. Fechou os olhos e apontou para um tópico do mapa, seguiu. Entrou no trem encharcada, sem saber ao certo o que fazia, nem seus propósitos. Mas preferiu não pensar - o turbilhão em sua mente cessara.

Sabia apenas que a vida tem suas própria razões, que leva para caminhos desconhecidos por motivos que não se entende. E talvez, o próximo destino lhe reservasse um café menos amargo e uma chuva mais amena.


sexta-feira, 26 de novembro de 2010

canción de ira y esperanza

De qualquer forma, despisto minhas filosofias e insisto na ambivalência desse caráter humano cuja volubilidade colore o pacato ritmo cotidiano, assimilando com deformidade a real velocidade do tempo e gracejando com o passado que o repentino dissimulou. Persistem algumas dúvidas, de qualquer forma, e agarro-me às justificativas para não lembrar que, antes de tudo, sou eu quem sente o que minha razão trabalha para assimilar.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Quando as luzes do céu começaram a clarear, deitei-me no gramado.
Ali, sem eira nem beira, livre do mundo, assisti ao sol nascer.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

I fell in love at the seaside

Hoje me revi nas ondas do rio. As suas viravoltas com a areia tinham um ar apaixonado, embriagado por beijos e abraços.

Senti o teu corpo, fresco como a brisa oceânica, umedecendo-me a pele num leve arrepio enquanto desfrutávamos daquela amena cumplicidade.

Um jogo. Uma brincadeira impensada. Uma peleja onde são os sonhos que explodem e arrebentam-se no tempo.

Serás o mar, e eu a areia; nossa sina.


Hoje o vento era de sul. Um vento satisfeito...



10/set/2010

terça-feira, 24 de agosto de 2010

still see you in bed

Dando uma geral no desktop encontrei um texto antigo. Muito estranho reler, ainda mais nesse momento, onde meus pensamentos não pousam e constantemente me fazem viajar para longe daqui. Segue...


O plácido repouso em que deixamos o amor adormecer esfriou-se pelo nosso abandono, e, hoje, precisamos de muita força na vista para recordar o que moveu a nós e à vida. Perdemos a juventude do romance e demos voltas incertas sobre um ponto que relutávamos em chamar de final. E discutimos em vão tantas vezes porque o texto já havia mesmo terminado. Enfim, a sensação de perda não poderia doer porque em meu colo ainda te deitavas, alegre e fugaz, por mais que soubéssemos que nenhum dos dois, afinal de contas, ainda permanecia ali. Enganamos a nossos olhos e debochamos daquele amor triste que perdemos, e dentre tantas ilusões que criamos, covencemo-nos de que todas valeriam a pena se não nos reconduzisse direto à verdade cuja face nossa fraqueza não gostaria de encarar.

O tempo, lento em indiferença a nossas preces, calou nossos vacilos, para que deixássemo-nos ver. E assim o vimos, o plácido repouso do nosso amor, abandonado, indefeso e fraco. E vimos a distância entre o que somos e o que poderíamos ter sido. E vimos também a nossa fuga, desesperada em reconhecer que poderia desesperar-se. E sobramos, então, nesse nada em que estamos.
...Sobramos.

Com um amor abandonado, um choro incerto e um final em aberto. O coração cheio de esqueletos e de rancores, talvez traumatizado ou renascendo para novos amores. Com o coração bem grande, com dores não tratadas e com um olhar um pouco frio. Um coração meio desmontado, com lixo por todo lado e completamente bagunçado.
...E vazio.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

À Beira do Mar Aberto

e escapo brusco para que percebas que mal suporto a tua presença, veneno veneno, às vezes digo coisas ácidas e de alguma forma quero te fazer compreender que não é assim, que tenho um medo cada vez maior do que vou sentindo em todos esses meses, e não se soluciona, mas volto e volto sempre, então me invades outra vez com o mesmo jogo e embora supondo conhecer as regras, me deixo tomar inteiro por tuas estranhas liturgias, a compactuar com teus medos que não decifro, a aceitá-los como um cão faminto aceita um osso descarnado, essas migalhas que me vais jogando entre as palavras e os pratos vazios, torno sempre a voltar, [...]

e de novo então me vens e me chegas e me invades e me tomas e me pedes e me perdes e te derramas sobre mim com teus olhos sempre fugitivos e abres a boca para libertar novas histórias e outra vez me completo assim, sem urgências, e me concentro inteiro nas coisas que me contas, e assim calado, e assim submisso, te mastigo dentro de mim enquanto me apunhalas com lenta delicadeza deixando claro em cada promessa que jamais será cumprida, que nada devo esperar além dessa máscara colorida, que me queres assim porque é assim que és e unicamente assim é que me queres e me utilizas todos os dias, e nos usamos honestamente assim, eu digerindo faminto o que o teu corpo rejeita, bebendo teu mágico veneno porco que me ilumina e anoitece a cada dia, e passo a passo afundo nesse charco que não sei se é o grande conhecimento de nós ou o imenso engano de ti e de mim, nos afastamos depois cautelosos ao entardecer, e na solidão de cada um sei que tecemos lentos nossa próxima mentira, tão bem urdida que na manhã seguinte será como verdade pura e sorriremos amenos, [...]

e já não consigo voltar à tona porque a mão que me estendes ao invés de me emergir me afunda mais e mais enquanto dizes e contas e repetes essas histórias longas, essas histórias tristes, essas histórias loucas como esta que acabaria aqui, agora, assim, se outra vez não viesses e me cegasses e me afogasses nesse mar aberto que nós sabemos que não acaba nem assim nem agora nem aqui ............................................................................................

caio f.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

deixa o vento soprar, let it be

Eu apenas queria que você soubesse que os dias ensolarados ainda estão guardados comigo, e que cada segundo engolido pelo tempo apenas construiu melhor quem sou hoje. Hoje, mais do que qualquer dia, enxerguei o meu reflexo honesto, delineado em cada parte das imperfeições da minha sinceridade e da minha nudez.
Enxerguei quando amanheceu um velho sol lutando por espaço com algumas nuvens pesadas, é verdade, mas foi nesse momento raro da aurora que finalmente entendi que a vida, ora insofrida, ora doída, é o resultado da memória e das perspectivas, cuja experiência concebe os traços com sabedoria. No entanto é tão necessário reiterar o quanto o tempo deverá ser forte para borrar nosso alumiado encontro da paz. E, a cada desilusão iminente, sairei fortalecido, porque a peleja é o clichê da vida. E não importa o que digam meus músculos e minhas desventuras, eternamente o outro dia mais rijo me terá. Descobrirei diariamente novos pedaços meus, encaixarei minhas dúvidas com minhas réplicas e, com a tranqüilidade de cada amanhecer, depreenderei melhor o que sou exatamente.

Não importa o que falem teus olhos, eu não estou mais aqui.